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O BELO PARA O SER HUMANO

Gabriela Marcon

Atualizado: 5 de fev. de 2021

À medida em que crescemos e nos desenvolvemos, vamos formando nossos pensamentos e crenças centrais a respeito do que é bonito, feio, aceito, não-aceito, e nos percebendo como possuindo ou não tais características, gerando sentimentos sobre nossas percepções e, como consequência, reações no nosso comportamento. “Foram os gregos que trataram a beleza como um conceito pela primeira vez, observando a simetria e o equilíbrio das coisas. Na época do Romantismo, surge a ideia da beleza mais interna e a reflexão de como reajo àquilo que é belo. Então de uma concepção mais objetiva e racional, passamos a um entendimento mais subjetivo e sensorial, já que os sentidos passaram a interferir nas reações de acordo com as nossas vivências e sensações a respeito do que é bonito e feio, que muda de pessoa para pessoa e com o passar do tempo”, afirma o professor Horacio Francisco Rodríguez Fleitas, psicólogo e mestre em Filosofia e Educação.


Talvez o que nunca tenha mudado é a preocupação com a beleza, a vontade de se cuidar, especialmente no tocante à vaidade feminina. “A gente se arrumava para parecer ou ficar mais bonita. Como éramos jovens, também não precisava de tanta pintura no rosto. Eu era linda mesmo (risos)! Só que a gente não tinha os cremes e as maquiagens que as gurias têm hoje. Era comum usar o pó de arroz Lady que, às vezes, misturávamos com farinha de trigo para render mais, porque quando terminava não era bem assim para comprar outro, o dinheiro era curto”, recorda, com alegria, dona Ana Turella, 81 anos.


Professora aposentada, ela nasceu e viveu a adolescência na localidade de Caravaggio da 6ª Légua, no interior de Caxias do Sul. Apesar de morar na cidade há muitos anos, dona Ana ainda preserva o velho casarão do pai, onde guarda lembranças de quando se arrumava para ir aos bailes da década de 50. “Vaidosa sempre fui, mas não dava para comprar produtos a toda hora, nem existia opção e acesso. Na minha época era de menos, hoje é de mais. Mas desde a minha juventude não saio de casa sem batom. Ele é indispensável!”, enfatiza.



Dona Ana tem toda razão ao falar da infinidade de recursos de beleza disponíveis nos dias atuais. As mulheres de sua geração que, assim como ela, usavam leite de rosas e pó de arroz, não tinham conhecimento dos princípios ativos e efeitos desses cosméticos para realçar a beleza. De acordo com a biomédica e coordenadora do curso de Estética e Cosmética do Centro Universitário da Serra Gaúcha (FSG), Franciele Maria Zanol, hoje se sabe da eficácia dos mecanismos de ação de produtos mais antigos, pois existe comprovação científica. “A indústria de cosméticos investe muito em inovação tecnológica e temos como saber da eficácia dos produtos. Por outro lado, perdemos em qualidade de vida na comparação com a época de nossas mães, tias e avós”.


Para além da utilização de recursos que melhoram a aparência visual, a estética é considerada uma profissão dentro da área da Saúde. “Ela melhora a qualidade de vida e, consequentemente, a saúde das pessoas. Ainda que seja um conceito recente, é importante ressaltar que a estética também está no ambiente hospitalar, pois é válida para complementar tratamentos de saúde. É um olhar diferente”, observa a biomédica.

De uma forma geral, Franciele considera que a maioria das pessoas tem vontade de mudar ou melhorar algum traço visual que, com o passar dos anos, se torna um incômodo. Apesar de ser uma área delicada porque as pessoas têm expectativas que nem sempre podem ser atendidas, a biomédica destaca a questão do resgate da boa autoestima que vem junto com os tratamentos estéticos. “Já ouvi excelentes relatos de mulheres que apenas cumpriam suas agendas de trabalho, que não tinham vida social porque não se sentiam bem consigo mesmas, e depois que passaram por algum tratamento voltaram a sentir a beleza, pois ela tem relação com as sensações positivas que desperta em cada pessoa”, diz.


A autoestima aumenta a confiança, a segurança e o potencial de comunicação das pessoas. Ainda que haja mais informação e uma abertura de pensamento e mentalidade a respeito do conceito de beleza, a sociedade permanece sendo muito mais curativa do que de prevenção ao envelhecimento. Nesse sentido, é interessante mencionar que crianças, adolescentes e adultos que hoje se encontram na faixa-etária dos 10 aos 30 anos de idade, começam a se cuidar mais cedo porque têm mais conhecimento. Além disso, os próprios pais pertencem a uma geração que não tinha a cultura da prevenção, mas tem plena consciência que o uso de protetor solar (apenas para citar um dos produtos mais difundidos pelo mercado) é fundamental para evitar o aparecimento de doenças graves como o câncer de pele.


Outro aspecto bem visível na sociedade contemporânea é o reflexo de uma espécie de autocontrole sobre a imagem que cada um quer transmitir ao outro. Isso muito em função das mídias sociais, que se tornaram um meio de propagação pessoal que não existia há 60 anos, na época da juventude de dona Ana que, com toda sabedoria, ensina: “A pessoa se torna mais bonita quando ela está feliz e tem autoestima. Às vezes não estou muito bem e nem gosto de me olhar no espelho. Então o interior reflete o exterior”.


A beleza real e descomplicada


Com a coqueluche das selfies potencializada pelos holofotes digitais é como se as pessoas tivessem ficado obcecadas por si mesmas, entrando em um ciclo onde é preciso estar ou parecer bonito (para o outro) o tempo inteiro. Porém, até que ponto essa transparência é real? Agradar aos outros é difícil, uma vez que o conceito e a percepção do belo, conforme já pontuou o professor Horacio no início desta reportagem, são diferentes para cada pessoa e se transformam com a evolução do tempo e o comportamento da sociedade. É uma experiência, portanto, subjetiva. Desapegar de referências expostas pela sociedade midiática, principalmente nesta era do artificial marcada pelo uso de aplicativos de maquiagem e filtros para o rosto, é um dos primeiros passos em direção à beleza real e descomplicada.


Há 20 anos, a fisioterapeuta dermatofuncional Leandra Paes mantém como base de seu trabalho descobrir nas pessoas o que elas têm de bonito, focando nos tratamentos de prevenção ao envelhecimento e sem o uso de métodos invasivos. Não é apenas a parte física que é tratada, já que os resultados, segundo ela, também têm relação com o aumento da boa autoestima. “O caminho é explorar e realçar as qualidades dos traços de cada pessoa, melhorando o que é possível e convivendo em paz com aquilo que não pode ser mudado ou que a pessoa considera que seja uma imperfeição. É buscar recursos estéticos para satisfazer a si mesmo, não aos outros”, ressalta.


Cada pessoa, acrescenta a fisioterapeuta, tem um equilíbrio facial. “Quem passa por muitas intervenções cirúrgicas no rosto não consegue mais parar de mexer e, por isso, acaba provocando uma desarmonia. Falta a essas pessoas o entendimento de que elas estão buscando no outro o que é belo, e não em si mesmas”. Conforme Leandra, o desconforto com a própria imagem aparece em especial nas mulheres e atravessa gerações. “As mulheres sempre se cuidaram, mas na época da minha avó, por exemplo, elas tinham peles mais saudáveis porque não ficavam tanto tempo no sol, usavam menos maquiagem e se alimentavam melhor. Mas a diferença crucial é que no tempo delas não havia redes sociais, celulares com câmeras e, por isso, não havia tanta exposição como hoje”, analisa.


Leandra conta que atende várias clientes que enfrentam processos de divórcio, que passam por sérios problemas emocionais ou tratamentos de saúde de doenças graves. “Elas começam a enxergar que têm potencial e o quanto é importante resgatar a beleza real, da própria personalidade. E quando alguém se descobre bonita começa a curar metade dos seus conflitos emocionais”, afirma. Seguindo esta linha de trabalho, a profissional é procurada por mulheres que não querem ficar com o rosto “paralisado” e buscam a manutenção da harmonia dos traços faciais para envelhecer bem, considerando que ter rugas e linhas de expressão representam a história de vida de cada pessoa.

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